Direito Eleitoral: Decisão que conseguimos no TRE GO sobre a extrapolação do limite de 20% do aluguel de veículos automotores.

RECURSO ELEITORAL (11548) – PROCESSO N. 0601362-76.2020.6.09.0050 – URUAÇU/GOIÁS.

RELATOR: JOSÉ PROTO DE OLIVEIRA

 RECORRENTE: ELEICAO 2020 LUDIMILA MARTINS DE CASTRO VEREADOR
ADVOGADO: RAPHAEL RODRIGUES DE AVILA PINHEIRO SALES – OAB/GO25390-A
ADVOGADO: EDILBERTO DE CASTRO DIAS – OAB/GO13748-A
RECORRENTE: LUDIMILA MARTINS DE CASTRO
ADVOGADO: RAPHAEL RODRIGUES DE AVILA PINHEIRO SALES – OAB/GO25390-A
ADVOGADO: EDILBERTO DE CASTRO DIAS – OAB/GO13748-A

DECISÃO MONOCRÁTICA

I – Relatório

Trata-se de Recurso Eleitoral interposto por LUDIMILA MARTINS DE CASTRO, então candidata ao cargo de Vereador, em face da sentença proferida pelo Juízo da 50ª Zona Eleitoral, por meio da qual julgou desaprovadas as suas contas de campanha e condenou ao pagamento de multa no importe de R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais).

Em suas razões recursais (ID 36993607), a Recorrente sustenta que, de acordo com precedentes do Tribunal Superior Eleitoral, a inobservância do limite de gastos com aluguel de veículos não autoriza a aplicação da multa prevista no art. 18-b da Lei 9.504/97.

Diz que “em municípios extensos como Uruaçu Goiás e em centenas de outros em todo Brasil, é impossível fazer uma campanha competitiva sem o uso de veículo automotor.”. E, ainda, que “ao limitar 20% o aluguel de veículos automotores, a maioria dos candidatos com baixa arrecadação ficou literalmente impossibilitado de se locomover durante uma campanha, pois é impossível alugar um veículo a um custo baixo, principalmente no interior dos estados brasileiros.”

Ao final, requer que o Recurso seja conhecido e provido para reformar a sentença e aprovar as contas com ressalvas, retirando a condenação ao pagamento da multa, ou que seja reconhecida a inconstitucionalidade do art. 26 § 1º II da lei 9054/97 e do art. 42, II, da Res. TSE nº 23.607/2019, “por ferir os princípios da igualdade de condições entre os candidatos e da razoabilidade”.

Com vista, o douto Procurador Regional Eleitoral deixou transcorrer o prazo sem manifestação.

É o Relatório.

II – Análise dos Requisitos de Admissibilidade

Consta nos autos intimação da sentença pelo sistema PJE no dia 02/02/2022 e o recurso foi protocolado no dia seguinte (03/02/2022), portanto, dentro do prazo legal. Presente este e os demais requisitos de admissibilidade recursal, conheço do recurso.

III – Mérito Recursal

Segundo o Juiz Eleitoral sentenciante, acompanhando o parecer técnico, a Prestadora de Contas extrapolou o limite de gasto com aluguel de veículo em relação ao total de gastos de campanha, razão pelas quais desaprovou as contas com a aplicação de multa equivalente a 100% o valor extrapolado.

Quanto ao tema, o art. 26, §1º, inciso II, da Lei nº 9.504/97, cujo texto foi reproduzido pelo art. 42, inciso II, da Resolução TSE nº 23.607/2019, estabeleceu nova regra, na qual previu limites para algumas despesas em específico. Vejamos:

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

I – alimentação do pessoal que presta serviços às candidaturas ou aos comitês de campanha: 10% (dez por cento);

II – aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

In casu, atentando-se à literalidade do citado artigo, foi detectada na presente prestação de contas que a despesa com a locação/cessão do veículo VW/GOL – no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) –  ultrapassou o limite de 20% em cotejo com o total de gastos realizado pela candidata (R$ 3.500,00), em R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais).

Nesse particular, entendo que há que se fazer uma ponderação: embora o legislador estivesse impregnado de intenção moralizante no que pertine à limitação dos altos gastos de campanha, na verdade, acabou por estabelecer uma regra que praticamente inviabiliza as pequenas candidaturas em detrimento das campanhas de grande porte, como ocorre no presente caso.

Isto porque nas campanhas de candidatura mais simplórias, cujas despesas totais sejam reduzidas – v.g., R$ 5.000,00 -, situação extremamente comum nos rincões do país -, não seria possível ao candidato proceder à locação de veículos, pois obrigado legalmente a contratar por um valor compatível com a média do mercado nacional. Situação assemelhada não ocorreria nas candidaturas com potencial de arrebanhar elevadas receitas.

Em situação assemelhada, já tive oportunidade de me debruçar recentemente sobre essa particularidade e, à oportunidade, ponderei que “tal inconsistência é apurada com base, exclusivamente, no critério objetivo, ou seja, sem análise das circunstâncias do caso concreto. Pois se por um lado exige-se do prestador que a avaliação dos bens e dos serviços estimáveis em dinheiro tenha como parâmetro os preços praticados no mercado, não se pode impor ao prestador que realize contratações em valores muito aquém do mercado, sobretudo quando se tratar de uma candidatura de baixo custo, como na espécie” (RE 0600661-66.2020.6.09.0131, julgado em 21/04/2021).

O Tribunal Superior Eleitoral, em situação similar ao presente, considerou que a aludida irregularidade tem aptidão para gerar apenas ressalvas, ante a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, como se observa no Recurso Especial Eleitoral nº 27547, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação:  DJE – Diário da justiça eletrônica, Tomo 62, Data 01/04/2019, Página 61/62.

Esta Corte goiana também perfilha da mesma compreensão (RE 0600502-89.2020.6.09.0013, REl Juliano Taveira Bernardes, julgado em 21/10/2021; REl n. 0600697-74.2020.6.09.0013, Rel. Márcio Antônio de Sousa Moraes, julgado em 22/9/2021).

De outra banda, verifico que o Juiz Eleitoral em sua sentença aplicou multa com base no art. 6º da Res. TSE n. 23.607/2019. Todavia, o aludido artigo refere-se à fixação de multa por extrapolação dos limites globais de gastos com as campanhas, prevista no artigo 18-b da Lei n. 9.504/1997, sendo que o art. 42, II, da Resolução TSE n. 23.607/2019, que estabelece o gasto máximo com aluguel de veículos automotores, decorre da previsão do inciso II do § 1º do art. 26 da Lei n. 9.504/1997, o qual não prevê a aplicação de multa para o caso de descumprimento da referida norma.

Colho, no particular, o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral sobre esse ponto específico:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INOBSERVÂNCIA DO LIMITE DE GASTO COM ALUGUEL DE VEÍCULOS. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 18–B DA LEI Nº 9.504/1997. NÃO CABIMENTO. PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE RECURSOS PÚBLICOS. DEVOLUÇÃO DE VALORES. REEXAME. ENUNCIADO SUMULAR Nº 24 DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.

1. A incidência da sanção pecuniária prevista no art. 18–B da Lei das Eleições está adstrita apenas aos casos de descumprimento dos limites de gastos globais fixados para cada campanha.

2. Na espécie, a inobservância do limite de gastos com locação de veículos (art. 26, § 1º, II, da Lei nº 9.504/1997) não autoriza a aplicação da multa prevista no art. 18–B da referida lei.

(…)

(TSE, REspEl n. 060151147, Rel. Min. Og Fernandes, DJE de 22/9/2020)

Deste modo, considerando as ponderações acima e os precedentes citados, inclusive do Tribunal Superior Eleitoral, entendo que a irregularidade remanescente não tem o condão de ensejar a desaprovação, à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de sorte que deve a sentença ser reformada, afastando-se a aplicação da multa.

IV – Dispositivo

Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao Recurso Eleitoral para APROVAR COM RESSALVAS as contas de campanha de LUDIMILA MARTINS DE CASTRO, relativas às eleições de 2020, com suporte no art. 74, inciso II, da Resolução/TSE nº 23.607/2019, afastando, a multa aplicada.

Goiânia, na data da assinatura digital.

JOSÉ PROTO DE OLIVEIRA

Juiz Relator

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